Eram pra ser apenas algumas indicações - Vol. I
E como eu vou falar de música sem falar de mim? O que era para ser um apanhado de músicas boas e pessoas queridas, tornou-se a extensão da terapia, mais uma vez... mas com música pra caralho
Conhecer pessoas, na maioria das vezes, é uma ponte sensacional para conhecer músicas novas, por mais que conhecer pessoas seja, na grande maioria das vezes, uma situação não muito confortável para esse careca que vos escreve.
Mas hoje eu decidi que essa newsletter não vai ser a extensão da minha terapia, como foram os dois últimos textos. A ideia é mostrar algumas músicas e artistas que me foram indicados por pessoas queridas ao longo de alguns anos. (Esse foi o ingênuo começo desse texto)
São Yantó, Quartabê e Negro Leo
Quando eu escrevia para o jornal O Diário do Norte do Paraná, eu tive a honrosa tarefa de entrevistar um maringaense que, em 2016, já estava botando pra foder na música nacional, meu xará Rafael Montorfano, vulgo Chicão. Eu não lembro como a pauta surgiu, mas eu imagino que tenha vindo do Rodriguinho, o Cabeça, amigo já citado no texto anterio
Logo nas pesquisas, descobri São Yantó, parceiro musical de Chicão desde os tempos de Unicamp, que na época se apresentava como Lineker, o seu nome de batismo (não confundir com a Liniker). O EP Verão tinha acabado de ser lançado. Desde então, veio o disco LINEKER (2016) e Sítio Arqueológico (2023), além de alguns singles.
Se todos os artistas publicassem o encarte junto com o streaming, como faz Yantó em seu site, a vida seria mais colorida.
Durante a nossa conversa, descobrimos que estudamos música na mesma escola em Maringá. Também a mesma que o Cabeça. Os dois já eram alunos prodígios, eu era um aluno meia boca querendo tocar como Brad Wilk, baterista do Rage Against The Machine (hahahaha). Até hoje, quando escuto Rage, me dá vontade de gritar como o Zack de La Rocha ou descer a lenha como Brad. Mesmo não fazendo nenhuma das duas, sinto que a minha raiva é despejada ali com eles.
Enfim, conheci esses dois monstros e mantive um contato virtual com Chicão. Nos encontramos pouquíssimas vezes e, na última delas, em São Paulo, nos esbarramos sem querer. Eu, bêbado, na calçada do Pompeu, e ele, também bêbado, voltando de uma apresentação que tinha feito no Teatro Oficina. Conseguimos conversar um pouco e ele me disse que estava tocando com a Gal Costa. É isso mesmo, nada mais nada menos que a Gal.
Foi ainda na nossa primeira conversa que eu fiquei sabendo da existência da banda Quartabê, formada por ele, Joana Queiroz, Maria Beraldo e Mariá Portugal. O quarteto lançou o EP Depê (2017) - com participações de Juçara Marçal, MC Soffia, Tulipa Ruiz, Arrigo Barnabá, Tim Bernardes e Arrigo Barnabé - e os discos Lição #1: Moacir (2015) e Lição #2: Dorival (2018). Outra banda com site bonitinho, coisa linda
Jogo Duro foi o último projeto que eu vi o Chicão envolvido, mas provavelmente já dever ter surgido coisa nova. Além do maringaense, Jogo Duro é formado por Anthony Gordin, Samuel Fraga, Guizado e Zé Nigro.
Eu conheci o maranhense Negro Leo exatamente no dia do lançamento do seu terceiro álbum da carreira musical: Água Batizada (2016). Quando acordei, tinha uma mensagem de Chicão me dizendo para ouvir. E foram algumas minutos para começar a entender a indicação.
Mesmo sem água batizada, a cabeça despirocou. Negro Leo é dedo no cu e gritaria, uma joelhada atrás da outra, na nuca. E esse é só um no meio dos cinco que Negro Leo colocou no mundo. Antes desse, teve Ilhas de Calor (2014) e Niños Heroes (2015). Depois, as joias Action Lekking (2017) e Desejo de Lacrar (2020).
Corri atrás de uma entrevista já nos dias seguintes. Nossa conversa saiu pelo Scream&Yell e também repassei para o meu Medium.
Maciel Salú e Juvenil Silva
Quando comecei a trabalhar no Diário, também conheci mais de perto um festival que tinha ido alguns anos antes: Paraíso do Rock. Produzido pelo prefeito de Paraíso do Norte (PR), e se encaminhando para a 14ª edição, é parada quase que obrigatória no mês de julho.
Betão e Cintia me receberam da melhor forma possível, dando de comer e beber para um mero “jornalista” que encheu a cara e acordou tarde pra caralho no domingo, depois que todos os convidados já tinham ido embora. E ainda me deram café da manhã (quase da tarde) e continuaram me recebendo nos anos seguintes. Beijo no coração de vocês, Beto, Cintia e a família Vizzotto. Se alguém achar um prefeito mais fuderoso que esse, eu arranco meus cabelos.
Foi lá que eu ouvi, pela primeira vez, dois pernambucanos que eu guardo fundo no coração e na minha memória musical, Maciel Salú e Juvenil Silva.
Maciel tem a cultura popular no sangue. É filho do grande Mestre Salustiano e neto do também rabequeiro João Salustiano. Na carreira solo e como integrante da Orquestra Contemporânea de Olinda, Maciel leva a música pernambucana para todo canto do Brasil e do mundo. Quiçá, um dos melhores representantes que o Brasil poderia ter. Tive o prazer de fazer uma entrevista com ele, por e-mail, e depois o conheci em carne e osso. Para quem quiser conferir a entrevista.
Dos álbuns de Maciel, vale um destaque para Mundo (2010) e o EP Ogum (2023). Mas vale muito entrar nos streamings e fuçar em tudo que ele fez e continua fazendo.
A entrevista que eu fiz com o Juvenil naquela época se perdeu, mas lembro de uma observação que ele fez logo que nos apresentaram lá no festival: “Esse cara me fez umas perguntas diferentes” (ou “estranhas” ou algo assim, não lembro as palavras exatas). Eu nunca perguntei se isso era positivo ou negativo, mas imagino que tenha sido positivo. Afinal, vieram mais algumas depois dessa. No Cadinho de Trela, durante a pandemia, quando eu coloquei a cara redonda nas lives do Instagram, Entrevista: O isolamento acústico de Juvenil Silva e Entrevista: 10 dias com Juvenil Silva foram algumas.
Como o próprio nome diz, essa última foi feita durante dez dias que passei em Recife, hospedado na casa de Juvenil. Estava lá para entrevistar pessoas maravilhosas para o meu TCC: “UDIGRUDI: GRANDE REPORTAGEM SOBRE A PRODUÇÃO MUSICAL DA MOVIMENTAÇÃO PSICODÉLICA PERNAMBUCANA DA DÉCADA DE 1970”, que é assunto para uma outra hora.
Depois desses dias conversando e conhecendo pessoas totalmente do caralho, passamos no Iraq, eu, Juvenil e sua companheira Raíssa, a minha última tarde na cidade. Bebendo. Na hora de ir embora, achamos, para o bem de todos, que deveríamos continuar bebendo, porque, caso dormisse, eu poderia perder o voo de volta, que era muito cedo.
(Um adendo: apesar de ficarmos na casa de Raíssa, ela foi dormir, porque tinha que trabalhar no dia seguinte, e havia recém começado em um emprego novo. Estou dizendo isso, porque foi dela que ouvi uma frase que repito até hoje, quando alguém lhe perguntou como estava o emprego ou se estava gostando: “quem gosta de emprego é desempregado”)
E assim foi. Durante esse período de “espera”, gravamos o faixa a faixa do disco Suspenso (2018) e Juvenil acabou me convencendo a fumar maconha, depois de muitos anos que eu não fumava. Eu disse que a maconha era uma droga que nunca tinha me feito muito bem, mas ele estava determinado: “Isso aqui não é prensado do sul. Isso aqui é maconha de verdade, aquilo lá que vocês fumam nem é maconha”. Não resisti. Dito e feito, não me fez mal.
Voltando ao que interessa, o cara é uma máquina de fazer música e está sempre agitando a cena musical de Recife, em carreira solo ou em algumas bandas, como Dunas do Barato, A Banda dos Corações Selvagens e outras que vai criando no caminho, ou fazendo festival e festas, como a Bregadelic.
Álbuns, são quatro: Desapego (2013), Super qualquer no meio de lugar nenhum (2014), Suspenso (2018) e Um belo dia nesse inferno (2022).
E o que tem no final dos textos?!
A playlist ainda sem nome definitivo!!
Sempre atualizada e ainda mais bonita!
Sigam, porque ela está cada vez mais bonita. E continua sem nome, porque, se vocês não perceberam, eu deixei um pouco de lado a saga do nome dessa newsletter maravilhosa. Mas algum dia eu retorno, porque estava divertido.
Um extrinha:
A junção de três grandes músicos citados aqui só poderia ser coisa linda. Música composta por Juvenil, que dá nome ao seu primeiro disco, Desapego, gravada por Yantó no EP de 2016, Verão, produzido por Chicão.
Adendo 2
Eu sei que já tomei demais do tempo e da paciência de vocês, mas gostaria de fazer esse segundo adendo.
Trabalhar no Diário do Norte do Paraná me abriu muitas portas, mas sempre foi meio chato escrever sobre música lá, por motivos e pessoas mesquinhas e escrotas. Muitas vezes, tive que escrever o nome do Tribo’s (bar que resiste com música autoral há décadas em Maringá) apenas uma vez na matéria, e não fazer o “serviço” (aquele quadradinho com informações do show), para que o texto passasse despercebido pelo editor chefe. Por motivos ainda mais escrotos, o bar não era bem visto pelo jornal e boa parte dos maringaenses, assim como ainda não é. Eu tive que fazer essa “artimanha”, inclusive, com uma entrevista com o Steve Shelley (batera do Sonic Youth)!! Também não pude mais fazer matéria de página inteira depois da entrevista que publiquei com o Naná Vasconcelos, porque esse mesmo editor chefe achou que não era relevante para Maringá uma entrevista com o melhor percussionista do mundo. Mas o importante é que passou ilesa e saiu, de página inteira, coisa linda. Depois é que fodeu. Fodeu, inclusive, uma matéria que eu fiz sobre o genial fotógrafo Milan Alran, quando da sua morte. O editor de fotografia queria espalhar as fotos do Milan pela página inteira. Não podia.
Tirando isso, tive muitos momentos bons. Tive a sorte de ter tido Jary e Wilame como editores do caderno de cultura. Wilame comprava as ideias e me ensinou as “artimanhas”. Eu sempre suspeitei que o Jary me deu uma coluna musical porque não teve muita paciência com os textos ruins de um estagiário, mas sendo isso ou não, agradeço imensamente. “Você sempre me fala de bandas novas que você está escutando, vamos fazer uma coluna, textos curtos, três linhas, vários parágrafos. Precisa de um nome, o que acha de Setlist? Então é isso, escreve o primeiro e a gente vai vendo”. E assim nasceu a Setlist, nem sentei para conversar. De pé ao lado da mesa dele e pronto, nasceu.
Eu tive a honra de tomar café muitas vezes com as lendas vivas Cláudio Viola e Luiz de Carvalho. O Roberto Silva nem deve ter ideia do que significou aquele almoço que tivemos no sujinho da Av. Brasil, me contando um pouco da vida de repórter policial: “Eu tenho medo é da polícia, não de bandido”. Naquele dia foi a primeira vez que ele me falou do levantamento gigantesco que fez do PCC em Maringá, que o jornal não quis publicar. Acho que isso pesou pra ele, porque ele me falou mais algumas vezes sobre isso, em outros momentos. Enquanto estava no jornal, pude acompanhar a busca pelo “Maníaco da Torre”, crimes que, mais uma vez, ele desvendou antes da polícia. Durante os dias dessa investigação, todos ficavam em silêncio, assim que ele colocava os pés dentro da redação. Silêncio, todos esperando ele contar o que havia descoberto. Viola, Luiz e Roberto são foda!
Lá, eu fiz amigos que tenho guardados na parte frontal esquerda do cerebelo até hoje, apesar da distância.
Alguns outros, deixo um beijo, porque minha mãe me ensinou que não posso desejar o mal de ninguém.
É isso. No final, escrever sempre é uma terapia.
Deixo aqui a linda entrevista que fiz com Naná: Afrobudista e psicodélico.
Muito foda! Fiquei curioso com o tcc!!